Amostra - Volume 2
Hero of End - Ataque das Sombras

Capítulo 1 - Divisão 7 em Perseguição
O ano é 1540 D.E. A vastidão branca de Frostgard estendia-se até onde os olhos podiam alcançar. Sob o céu cinzento do amanhecer, a neve rangeu sob os pés da Sétima Divisão, enquanto eles avançavam pela floresta branca, o ar cortante do amanhecer preenchido apenas pelo eco de passos rápidos na neve. À frente, o vulto do bandido parece se dissolver entre as árvores e a neblina que começa a se dissipar com a primeira luz do sol.
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Liam lidera o grupo, os olhos fixos no bandido à frente, cada músculo em seu corpo pronto para reagir. Seu foco é total, e a determinação em sua expressão demonstra que ele não deixará a presa escapar.
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— Precisamos ser mais rápidos! — ele lança as palavras por sobre o ombro, sem perder o passo. A neve espessa torna a corrida mais difícil, mas ele segue adiante, ignorando o frio que entorpece suas pernas.

Liam:
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Idade: 21 anos
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Ex-Capitão da 10ª Divisão
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Atual Subcapitão da 7ª Divisão
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Espadachim Veterano
Ao lado de Liam, Elena mantém o ritmo, o peso da espada batendo contra suas costas enquanto ela segura as rédeas com força. Seus olhos brilham com uma confiança quase inocente, um sorriso vitorioso surgindo ao ver o quão perto estão do bandido.
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— Agora ele não me escapa! — pensa com determinação, já idealizando o golpe final.
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Sem perder tempo, Elena puxa as rédeas com um movimento brusco, fazendo o cavalo disparar à frente dos outros.
— Deixa comigo, eu acabo com ele agora! — ela grita, avançando com tudo.
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Elena:
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Idade: 20 anos
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Ex-Subcapitã da 10ª Divisão
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Atual Oficial da 7ª Divisão
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Esgrimista Especialista
Com um impulso, ela faz o cavalo saltar em um grande arco, erguendo a espada com ambas as mãos, pronta para acertar o bandido em pleno ar.
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No instante em que Elena se aproxima do bandido, ele estende a mão com um movimento brusco, murmurando palavras indecifráveis. Um brilho esverdeado irrompe de sua palma, e antes que Elena possa reagir, uma rajada de vento feroz explode ao seu redor, cortando o ar com uma força devastadora. O impacto a atinge em cheio, lançando-a para trás com tal violência que ela perde o equilíbrio. O corpo se eleva no ar, rodopiando como uma folha em uma tempestade de neve, enquanto flocos brancos se enrolam ao seu redor, criando um turbilhão de caos.
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Liam, que vinha logo atrás, vê o acontecimento em um piscar de olhos, o horror tomando conta de seu peito.
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— Elena! — ele grita, o chamado atravessando o vento cortante. Sem hesitar, puxa com força as rédeas do cavalo, desviando bruscamente da trilha e abandonando a perseguição ao bandido. Com a precisão de um guerreiro treinado, ele acelera, cavalgando furiosamente em direção ao ponto onde ela está prestes a cair.
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O momento é um só: com um salto audacioso, ele abandona a sela de seu cavalo, os músculos em total sincronia. No ar, os dedos de Liam se estendem, procurando alcançá-la antes que o impacto da queda a despedaça-se. O encontro deles é uma colisão poderosa, mas perfeitamente calculada. O choque os leva ao chão, rolando juntos pela neve, mas Liam mantém o controle, amortecendo a queda.
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Eles param, os corpos entrelaçados e cobertos por uma cortina de flocos cintilantes, ambos respirando com dificuldade, ainda abalados pela adrenalina. Elena solta um gemido, atordoada, mas um sorriso desconcertado se forma em seu rosto, os olhos se fixando nele.
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— Eu... quase cheguei lá — ela murmura, a frustração visível, mas com um toque de orgulho ferido, como se se recusasse a aceitar a derrota.
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Liam, o rosto ainda marcado pela tensão do resgate, solta um grito, a raiva misturada com o alívio. — Idiota! Isso foi uma imprudência! Você tem ideia do risco que correu?! — sua voz tremia com a mistura de preocupação e fúria, o olhar feroz, como se ele pudesse ver toda a extensão do perigo que ela acabara de enfrentar.
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Elena solta um suspiro, o sorriso desconcertado desaparecendo de seu rosto. Ela olha para baixo, puxando o ar com dificuldade antes de erguer os olhos para Liam, que ainda a encarava com uma expressão séria, embora seus olhos já demonstrassem uma preocupação mais profunda.
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— Eu... me desculpe, Liam — ela diz, sua voz quase um sussurro, cheia de arrependimento. — Não pensei que fosse tão arriscado. Só... só queria acabar logo com isso e...— Ela para, incapaz de encontrar as palavras certas.
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O olhar duro de Liam amolece. Ele percebe a sinceridade no arrependimento dela e o peso que ela carrega por suas escolhas. Sem dizer nada, ele se aproxima e a envolve em um abraço firme, deixando de lado toda a raiva. Suas mãos a seguram com cuidado, como se estivesse certificando-se de que ela estava bem, sentindo o calor de sua presença viva ali, diante dele.
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— Só não faça isso de novo, ok? — ele sussurra contra seu cabelo, sua voz baixa, carregada de afeto e alívio. — Eu não sei o que faria se algo acontecesse com você, Elena.
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Ela se deixa relaxar nos braços dele, retribuindo o abraço com uma intensidade que só alguém que acabou de encarar o perigo consegue demonstrar.
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— Você me salvou mais uma vez, Liam... — Elena murmura, com um leve sorriso se formando enquanto olha para ele. — Como sempre faz...
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Liam suspira, soltando uma risada suave, quase como um alívio que ele vinha segurando. — Talvez, um dia, você pare de se meter em situações em que precise ser salva — ele responde, sua voz suave, mas com um toque de brincadeira.
Enquanto Liam e Elena trocavam aquele instante de conexão, o som repentino de galopes apressados os trouxe de volta à realidade. A tensão na trilha nevada aumentava à medida que a perseguição se intensificava, e logo Nyra estava à frente de todos, cavalgando com velocidade feroz, seu arco em mãos, e os olhos fixos no fugitivo.
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Nyra:
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Idade: 19 anos
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Ex capitã da 8ª Divisão
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Atual capitã da 7ª Divisão
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Arqueira de Elite
A arqueira já havia calculado a trajetória do alvo. Com um movimento rápido e fluido, sacou uma flecha da aljava e a encaixou no arco, puxando a corda com precisão e força. Nyra respirou fundo, bloqueando os sons ao seu redor, focando exclusivamente na figura que serpenteava entre as árvores.
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— Você não vai escapar de mim... — murmurou, com determinação.
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Com um som seco e firme, a flecha voou, cortando o ar como uma lâmina e indo em direção ao peito do fugitivo. Mas o ladrão, como se tivesse olhos na nuca, deu um salto ágil, virando o corpo no ar e desviando por poucos centímetros. A flecha se cravou em um tronco à frente, estremecendo com o impacto.
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— Que diabos...? — Nyra grunhiu, rapidamente puxando outra flecha. Sem hesitar, disparou novamente, e outra vez o fugitivo fez um movimento impressionante, girando o corpo e usando a força das pernas para se lançar em outra direção, evitando o projétil com habilidade quase sobrenatural.
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— Como ele consegue correr tão rápido?! Isso é impossível! — disse Kazuki, cavalgando logo atrás de Nyra, seus olhos fixos no fugitivo, incrédulo com tamanha agilidade.
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Kazuki:
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Idade: 16 anos
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Ex soldado da 13ª Divisão
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Atual oficial da 7ª Divisão
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Espadachim Veterano
— Não é impossível, Kazuki, ele apenas está usando a Soulmana dele — Nyra explicou, mantendo os olhos fixos no alvo enquanto puxava outra flecha da aljava. Sua voz era firme, mas carregava um tom de irritação contida, típico de alguém que já havia enfrentado o impossível antes.
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Kazuki franziu o cenho, sua mão apertando o cabo da espada em sua cintura.
— Usar Soulmana para desviar de flechas e correr desse jeito? — Ele balançou a cabeça, incrédulo. — Mesmo assim, é como se ele tivesse olhos nas costas!
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— Não subestime o inimigo — respondeu Nyra, disparando mais uma flecha. Dessa vez, ela mirou nos pés do fugitivo, mas, mais uma vez, ele saltou com incrível precisão, desviando do projétil. Nyra cerrou os dentes, frustrada. — E mantenha o foco, Kazuki. Isso não é uma corrida, é uma missão.
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Kazuki soltou um suspiro irritado, mas assentiu, desviando o olhar rapidamente para os arredores. Ele sabia que Nyra tinha razão, mas ainda não acreditava como era possível.
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— Está bem, mas eu ainda não entendo como ele pode se mover tão rápido, e desviar de suas flechas sem nem vê-las… — disse ele enquanto segurava as rédeas com mais força.
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Antes que Nyra pudesse responder, o som de passos suaves na neve e o balançar de galhos atrás deles chamou a atenção dos dois. Uma figura encapuzada emergiu da floresta, montada em um cavalo cinza, sua postura relaxada contrastando completamente com a intensidade da perseguição. Ayumi, a curandeira da Sétima Divisão, finalmente se juntava ao grupo.
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Ayumi:
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Idade: 18 anos
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Ex oficial da 10ª Divisão
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Atual oficial da 7ª Divisão
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Curandeira Especialista
Ayumi esfregava os olhos com uma das mãos, enquanto a outra segurava as rédeas do cavalo com uma firmeza que parecia mais automática do que consciente.
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— Vocês estão fazendo muito barulho... — ela murmurou, sua voz arrastada e sonolenta, como se tivesse acabado de acordar de um cochilo.
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Kazuki arqueou uma sobrancelha, olhando para ela com incredulidade.
— Ayumi? Onde você estava? Não devia estar com a gente na trilha principal?
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Ayumi deu de ombros, a expressão sonolenta permanecendo enquanto ela respondia.
— Peguei um atalho... pensei que fosse alcançá-lo primeiro. — Ela fez uma pausa, olhando para o fugitivo à distância, antes de suspirar. — Mas, parece que ele é mais rápido do que eu imaginava.
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Nyra manteve o olhar focado no alvo, mas sua voz saiu firme.
— Então, se estava prestando atenção, diga-nos como ele está fazendo isso.
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Ayumi bocejou novamente, como se as palavras de Nyra não tivessem qualquer urgência. No entanto, começou a falar, sua voz calma, mas com a precisão de quem sabia exatamente o que dizia.
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— Ele está canalizando a Soulmana dele... por todo o corpo, mas especialmente nas pernas. Isso aumenta a força e a velocidade muscular ao ponto de ele conseguir ultrapassar a velocidade de um cavalo. — Ela apontou vagamente para o fugitivo com a cabeça, enquanto ajustava o capuz. — E ele também está usando essa energia para fazer movimentos mais fluidos e ágeis.
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Kazuki a encarou com uma mistura de fascínio e confusão.
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— Tá, isso explica a velocidade, mas como ele consegue desviar das flechas de Nyra? Ele nem olha para elas!
Ayumi suspirou, como se fosse óbvio.
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— Campo sensorial. Ele está usando uma técnica avançada. A Soulmana dele está criando uma espécie de "rede" ao redor do corpo. Não importa de onde venha o ataque, ele sente a vibração no campo antes de ser atingido.
Kazuki piscou, processando a explicação.
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— Então, ele está basicamente antecipando tudo antes de acontecer... Isso é... injusto!
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Nyra apertou os lábios, sem desviar o olhar do fugitivo.
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— Não é injusto, é estratégico. Isso só significa que precisamos ser ainda mais inteligentes.
Ayumi inclinou levemente a cabeça para o lado, quase como se fosse adormecer no momento seguinte.
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— Ou podemos cansá-lo... essa técnica consome muita energia. Ele vai diminuir o ritmo eventualmente... se não o pressionarmos demais.
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Nyra soltou um leve suspiro, ainda tensa.
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— Não temos tempo para esperar ele se cansar. — Então, voltou o olhar para Ayumi, sua expressão ficando mais severa. — Onde está a Rya? Ela estava com você, não estava?
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Ayumi, ainda meio sonolenta, esfregou os olhos antes de responder, como se sua mente estivesse se ajustando ao ritmo frenético da situação.
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— Ah, é verdade... Ela ficou na outra rota. Disse que ia cortar o caminho e... — Ayumi fez uma pausa, como se ponderasse sobre algo. — Ah, sim, ela falou que tinha certeza de que ia capturar ele com o novo brinquedo dela.
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— Brinquedo?! — Kazuki e Nyra exclamaram ao mesmo tempo, trocando olhares surpresos.
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Antes que Ayumi pudesse elaborar, o som de um galope frenético irrompeu entre as árvores. De repente, uma figura surgiu à frente, em meio à neve e à neblina que começava a se dissipar.
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Era Rya, montada em seu cavalo com a confiança de quem já havia vencido a batalha antes mesmo de começar. Seus cabelos castanhos e curtos balançavam ao vento enquanto um sorriso largo iluminava seu rosto.
— Te peguei! Hahaha! — ela gritou animadamente, sua voz vibrante rompendo a tensão no ar.
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Rya:
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idade: 15 anos
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Ex sub-oficial da 10ª Divisão
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Atual Oficial da 7ª Divisão
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Engenheira Prodígio
Rya, sempre imprevisível e cheia de energia, segurava uma engenhoca artesanal nas mãos. Feita de metal e madeira, com engrenagens expostas, parecia algo improvisado, mas bem feito. A alça de disparo, simples, estava conectada a molas e cabos, preparando o mecanismo para a ação.
Ela puxou o gatilho, e a engenhoca disparou: uma corda de nylon grossa, com pesos de metal em cada extremidade, cortou o ar com um zumbido agudo. A corda girava em alta velocidade, criando uma armadilha instantânea, seu funcionamento era rudimentar, mas surpreendentemente eficaz.
O fugitivo ouviu o som distinto e, por um breve instante, sua expressão de confiança foi substituída por surpresa. No entanto, ele reagiu com reflexos incríveis, demonstrando uma velocidade e precisão quase sobre-humanas. Em vez de tentar desviar lateralmente, ele se jogou para o chão com uma habilidade surpreendente, executando uma "rasteira" perfeita que o fez deslizar sob a corda giratória.
Rya observou o movimento com os olhos arregalados. — O quê?! Ele passou por baixo?! — gritou, incrédula.
A corda, agora sem um alvo, continuou em seu trajeto... direto em direção ao cavalo de Kazuki. O impacto atingiu as pernas do animal, desequilibrando-o completamente. O cavalo de Kazuki foi atingido nas pernas com força, perdendo o equilíbrio. Com um relincho agudo, o animal caiu pesadamente, rolando pela neve e gerando uma força brutal que o fez se espalhar no chão.
Kazuki, lançado para frente pela inércia, não conseguiu se manter na sela e foi arremessado com violência. Ele colidiu de frente com uma árvore, atingindo o abdômen em um impacto brutal. O choque foi tão forte que ele sentiu a dor atravessar o corpo, as costelas pressionando contra seus órgãos, e uma sensação de sufocamento o envolveu momentaneamente.
— Aghhh! — ele gemeu de dor, permanecendo no chão.
— Kazuki! — Ayumi gritou, puxando as rédeas de seu cavalo enquanto desacelerava.
O fugitivo não perdeu tempo. Levantou-se da rasteira com agilidade impressionante e avançou diretamente para o cavalo de Rya. Antes que ela pudesse reagir, ele saltou com precisão, agarrando-se à sela do animal e empurrando-a violentamente para fora.
— Ei! Sai daqui, seu...! — Rya exclamou, mas o ladrão já havia tomado o controle do cavalo, deixando-a caída na neve enquanto ele continuava sua fuga em disparada.
Ayumi parou ao lado de Kazuki, desmontando rapidamente. Sua expressão sonolenta desapareceu, substituída por uma seriedade que raramente mostrava. — Ei, Kazuki, você está bem? Fala comigo! — disse, colocando a mão em seu ombro.
Kazuki gemeu de dor, o som abafado pela pressão no abdômen. Ele tentou levantar o rosto, mas a dor nas costelas o fez se contorcer, uma sensação de pressão intensa em seu peito, como se algo estivesse comprimindo seus pulmões.
— Eu... estou bem... só... preciso de um segundo — murmurou, forçando as palavras a saírem, mas a respiração se tornando mais difícil a cada instante.
O impacto com a árvore tinha sido cruel. Seus músculos do abdômen estavam provavelmente contundidos e suas costelas, possivelmente fraturadas, não permitiam que ele se movesse com liberdade. Além disso, um agudo golpe no estômago fazia com que ele sentisse uma dor de entorpecimento que se espalhava pelas entranhas, dificultando até mesmo a respiração.
Ayumi suspirou, já avaliando os danos. Ela notou que ele tentava se apoiar em um braço, mas os movimentos eram fracos, como se o corpo estivesse lutando contra a dor. — Não se mexa ainda, ou vai piorar, — ela disse com urgência, colocando a mão sobre o peito dele para impedir qualquer movimento brusco. Sabia que as lesões internas poderiam ser graves, talvez um traumatismo no abdômen, o que explicava a dificuldade em respirar e a expressão de agonia em seu rosto.
Sem perder tempo, Ayumi se agachou ao lado de Kazuki, suas mãos tremendo levemente enquanto se concentrava. Uma aura esverdeada começou a emanar de seus dedos, aquecendo o ar ao redor.
— Fique calmo, Kazuki. A dor vai passar, — disse, sua voz suave, mas firme.
Com as mãos sobre seu corpo, Ayumi direcionou sua magia. A luz dourada envolveu o abdômen de Kazuki, e ele sentiu a pressão nas costelas diminuir lentamente. A dor aguda foi substituída por um alívio crescente, como se sua musculatura estivesse sendo reorganizada, alinhando-se de volta com precisão. As fraturas começaram a cicatrizar, e ele sentiu uma onda de calor penetrante, mas curativa.
Ayumi estava visivelmente exausta, mas continuava, mantendo a magia concentrada, até que o alívio completo começasse a tomar forma. Quando finalmente retirou as mãos, a luz ao redor dele foi se dissipando.
— Está melhor? — ela perguntou, ofegante.
Kazuki, ainda com a respiração pesada, tocou seu abdômen, sentindo a dor ter diminuído consideravelmente.
— Sim... muito melhor. Obrigado, Ayumi. Você é realmente excelente em magia de cura.
Ayumi sorriu levemente, embora ainda visivelmente cansada.
— Obrigada, Kazuki. Eu só fiz o meu trabalho — disse, passando a mão sobre a testa para enxugar o suor. — Mas você ainda precisa descansar para se curar completamente.
Kazuki assentiu lentamente, ainda sentindo o peso da dor, mas agora com uma sensação de alívio.
— Você tem razão. Vou ficar de repouso quando a missão acabar. Obrigado de novo, Ayumi... — ele disse com um sorriso cansado, fechando os olhos enquanto se recostava na neve. — Não sei o que faria sem você na nossa divisão.
Ayumi ficou um momento em silêncio, um leve rubor se espalhando por suas bochechas, incomodada pela sinceridade de Kazuki, algo que ela não estava acostumada a receber. Embora sua expressão fosse de indiferença habitual, seus ombros ficaram um pouco tensos, como se tivesse sido pega de surpresa.
— Não foi nada, — respondeu, desviando o olhar, tentando esconder o desconforto. — Apenas... não me faça ter que salvar você de novo.
Ela deu um suspiro e, sem esperar uma resposta, olhou para o horizonte. A perseguição ainda não havia terminado, e a sensação de que estavam sendo observados continuava no ar. O som distante de cascos quebrava o silêncio, confirmando que o inimigo não estava longe.
— Vamos logo. Não estamos fora de perigo ainda, — disse ela, voltando a montar no cavalo.
Kazuki, agora mais calmo, se levantou com dificuldade, embora ainda sentisse a dor nas costelas. Eles sabiam que o pior estava por vir, e não tinham mais tempo para perder.
Capítulo 2 - O Andarilho do Vento
A neve caía como um manto pesado sobre a floresta, mas Nyra não se deixava distrair pelos flocos brancos que lhe cobriam os cabelos e o rosto. Seu foco estava apenas em um único ponto: o fugitivo à frente. O vento cortava sua pele com a ferocidade de um lobo faminto, mas ela não vacilava. A égua que montava, também impetuosa e habituada às trilhas intransponíveis daquelas terras geladas, seguia firme na perseguição.
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A cada estalo das patas contra o gelo, a distância entre ela e o criminoso parecia diminuir. Mas ele também era veloz, suas habilidades na sela visíveis a cada manobra hábil para desviar de obstáculos e ganhar terreno. Ela sabia que a corrida estava longe de terminar, e cada movimento seu precisava ser perfeito, calculado. A pressão de não deixar o fugitivo escapar fazia seu sangue ferver.
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— Você não vai escapar — Nyra murmurou mais uma vez, seus lábios quase congelando ao pronunciar as palavras.
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Com uma precisão impressionante, ela puxou outra flecha da aljava, sentindo a madeira esquentar sob suas mãos ásperas. A caçada não era apenas por justiça; para ela, era uma necessidade visceral, algo que já a consumia por dentro. Mas, ao mesmo tempo, sentia um alerta crescente. A perseguição estava prestes a entrar em um terreno onde até ela poderia se perder.
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O som do vento açoitava seus ouvidos, e, por um momento, ela se perguntou se o fugitivo tinha realmente planejado aquela fuga ou se ele tinha algo mais em mente…
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Enquanto Nyra continuava sua perseguição implacável, o som das patas da égua ecoando na trilha gelada, o cenário ao redor começava a mudar. A trilha estreita da floresta dava lugar a uma região mais aberta, onde o vento gélido cortante soprava com mais força, levando flocos de neve a dançar pelo ar. A paisagem parecia se expandir, e ela podia ver as vastas planícies de neve à sua frente, enquanto o fugitivo, agora mais distante, continuava sua fuga desenfreada.
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Ela apertou os dentes e acelerou o ritmo, seus olhos fixos na figura à frente. Mas então, sem aviso, o vento mudou de direção, e uma rajada mais forte fez a égua de Nyra relinchar, assustada. Ela se inclinou para frente, agarrando com firmeza as rédeas, mas não foi o vento que a fez hesitar. Algo mais estava no ar, uma presença que ela não esperava.
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Antes que ela pudesse reagir completamente, uma sombra surgiu ao lado da trilha. O som cortante de um grito de vento a fez olhar para o lado, onde uma figura se destacava contra o fundo gelado… Era Liam.
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Com um movimento rápido, ele surgiu ao lado da trilha, sua espada erguida para o alto. O aço brilhou por um momento antes que ele a girasse com uma destreza incomum, direcionando a lâmina com um gesto preciso. O vento se intensificou, como se sua lâmina tivesse dominado a própria natureza. A espada de Liam cortou o ar com tal força que a rajada de vento se transformou em um golpe direto contra o fugitivo. Ele foi derrubado para o lado, perdendo o controle do cavalo, que relinchou com desespero.
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— Agora, não há mais para onde correr — disse Liam com uma voz firme, sua presença imponente ao lado de Nyra, que o olhava com surpresa, mas não sem um brilho de gratidão. Ele estava de volta à caçada, e, com ele, a perseguição tinha uma nova dinâmica.
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O fugitivo, agora caído na neve, tentou se levantar, mas o terreno estava descompensado. Eles estavam em um precipício, um terreno íngreme e escorregadio, onde o solo se desvanecia abruptamente para o abismo. Ele havia chegado à beira de um penhasco, com uma queda mortal à sua frente. O céu, lá no horizonte, estava tingido por um nascer do sol esplêndido, com tons quentes de amarelo que contrastavam com o frio intenso ao redor.
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— Renda-se agora, senhor Hikaru, ou melhor, ‘Ladrão de jóias’ — completou Nyra, a lâmina de sua espada refletindo a luz suave do amanhecer.
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Ele olhou para Nyra e Liam, que o cercavam. Seus olhares estavam fixos, sem piedade, e a tensão no ar era palpável. O fugitivo sabia que não havia mais escapatória, e o cenário ao fundo só aumentava a sensação de desespero, mas ainda assim, o fugitivo não se deu por vencido. O sol, nascendo lentamente sobre as montanhas distantes, iluminava toda a vasta terra de neve, como se fosse a última visão que ele teria antes da queda.
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— Ladrão de jóias? Sério que é assim que vocês estão me chamando? Que nome tosco! — Hikaru zombou, a expressão cínica se destacando em seu rosto. Ele fez uma pausa, como se estivesse refletindo. — Prefiro que me chamem de Hikaru. E se vocês não se importarem, eu preferiria sair daqui sem mais confrontos.
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— É claro que não iremos deixar você escapar. Você vem com a gente — disse Liam, sua voz firme, sem espaço para discussões.
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— Desista, não há para onde ir — acrescentou Nyra.
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— É, parece que estou encurralado, não é mesmo? — Hikaru disse com um sorriso irônico, seu olhar calculista passando rapidamente pelos inimigos ao redor. Com uma rapidez impressionante, ele sacou sua lâmina de vento, uma espada curta brilhando com uma energia sutil.
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A neve ao redor dele se movia com a leve brisa, a única coisa que se movia, enquanto ele tentava se equilibrar, a postura precária, o risco de cair a qualquer momento. Liam deu um passo à frente, sua espada brilhando sob a luz do sol nascente, um contraste de intenções. Ele estava pronto para agir. Nyra, ao seu lado, estava igualmente pronta, os olhos firmes, observando cada movimento do fugitivo.
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— Então eu terei que revidar agora… — concluiu, o tom despreocupado ocultando a intensidade de seu poder, enquanto o ar ao seu redor começou a se agitar de maneira inquieta, como se respondesse à sua convocação.
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“O que é isso? Esse mal pressentimento que estou sentindo…” Liam murmurou para si mesmo, a expressão tensa enquanto seus olhos se estreitavam, tentando decifrar a situação à sua frente. Ele fez uma pausa, como se a sensação de perigo o envolvesse completamente. “Algo perigoso está por vir…” concluiu, seus instintos aguçados começando a alertá-lo de que a ameaça estava prestes a se manifestar de uma maneira que ele ainda não podia prever.
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— Nyra! Tome cuidado! Ele é perigoso — Nyra! Tome cuidado! Ele é perigoso! — Liam gritou, seus olhos fixos no oponente enquanto sua postura se tornava mais defensiva, o tom urgente em sua voz revelando a gravidade da situação.
— Pode deixar, Liam! — ela respondeu com determinação.
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Sem hesitar, Liam levantou sua espada, assumindo uma postura de combate, os músculos tensos e os olhos brilhando com determinação. Sua lâmina refletia a luz ao redor, pronta para cortar qualquer ameaça que se aproximasse.
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E Nyra, percebendo a seriedade da situação, se manteve alerta. Ela sabia que o momento de agir chegara. Seus dedos se fecharam em torno da adaga, e ela se preparou para atacar com a mesma precisão que sempre a guiara, seus olhos fixos no inimigo, aguardando o movimento certo para reagir. Juntos, eles estavam prontos para enfrentar o perigo iminente.
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Liam foi o primeiro a atacar, seu corpo se movendo com a precisão de um guerreiro experiente. Com um movimento rápido, ele avançou, sua espada em uma linha reta em direção a Hikaru, visivelmente tentando encurtar a distância entre eles.
Nyra, não hesitando, seguiu logo atrás, sua lâmina cortando o ar com uma série de ataques rápidos, buscando criar uma abertura. Os dois se moviam juntos, coordenando seus golpes com maestria, tentando encurralar o fugitivo em um movimento de duplo ataque.
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Hikaru, porém, não parecia preocupado. Seus olhos ainda estavam calmos, e, com um movimento gracioso, ele se afastou para o lado com a leveza de uma brisa, quase dançando pela neve. Sua lâmina de vento se moveu de maneira fluida, interceptando os ataques de Nyra e Liam com facilidade. Cada golpe parecia ser desviado com um leve movimento de sua espada, como se estivesse apenas tocando as lâminas deles, conduzindo-as para o lado sem esforço.
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O ar ao redor dele parecia vibrar com uma leve corrente de vento, respondendo à sua postura tranquila. “Primeira forma da trilha,” pensava ele enquanto desvia os ataque. Ele não bloqueava com força, mas com leveza, como se as lâminas de seus oponentes fossem simples brisas que ele apenas desviasse com graça. A neve ao redor se movia em pequenas rajadas, como se o próprio ambiente estivesse em sintonia com ele.
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Quando a sequência de ataques terminou, Hikaru deu um passo para trás, seus olhos ainda fixos nos dois. Ele sorriu, o tom de suas palavras agora mais suavizado, como se estivesse falando com amigos e não com inimigos.
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O vento gélido soprava com força, cortando o silêncio tenso que envolvia o penhasco. A cena era quase surreal, com a vastidão branca da neve ao redor, o sol ainda nascendo no horizonte, mas a tensão entre os três personagens era palpável. Hikaru estava cercado, mas sua postura ainda mantinha uma leveza desconcertante, como se ele estivesse em um lugar seguro e confortável, ao contrário de seus adversários. Ele não parecia preocupado, apenas… curioso.
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— É só isso o que dois capitães têm? — Hikaru disse, sua voz carregada de um sarcasmo sutil. Ele observava Liam e Nyra com um sorriso irônico, seus olhos brilhando com uma confiança inabalável. — Sinceramente, eu esperava mais.
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Nyra se aproximou mais, seus olhos faiscando de determinação. Ela girou sua lâmina, o som do metal cortando o ar, e fez um movimento rápido, buscando uma abertura. Mas Hikaru, com um simples gesto da mão, desviou-se com a agilidade de uma brisa, a lâmina de vento em suas mãos guiando seus movimentos com uma leveza impressionante. A neve ao redor parecia se mover como se fosse parte do movimento, mas Hikaru mal tocava o solo. Ele não estava lutando, estava dançando.
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Liam, ao lado de Nyra, não hesitou. Com a espada levantada, ele atacou com precisão, tentando forçar Hikaru a reagir. Mas o fugitivo não parecia se apressar. Em um único movimento, ele deslizou para trás, deixando a lâmina de Liam passar raspando. O sorriso em seu rosto não desapareceu, nem mesmo com a intensidade dos ataques. Ele parecia completamente calmo.
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— Estamos pegando leve com você, por enquanto… — Nyra retrucou com frieza, observando cada movimento do fugitivo. O ar parecia denso, a cada segundo mais carregado de tensão.
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Hikaru riu baixinho, sua espada brilhando na luz suave do amanhecer, refletindo a confiança que ele ainda mantinha. Ele não parecia ter pressa, como se os ataques de Liam e Nyra fossem apenas uma distração para ele.
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— Ah, então é isso? Que interessante… porque eu também estou pegando leve, capitã… — disse ele, com uma ênfase divertida nas palavras, seu olhar ainda tranquilo, mas algo mais afiado por trás daquela fachada de indiferença.
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Nyra não tolerou o tom desdenhoso. Com um movimento rápido e impiedoso, ela avançou novamente, a lâmina cortando o ar em uma linha reta, buscando uma abertura. Hikaru, mais uma vez, desviou-se com uma leveza desconcertante. Mas dessa vez, ele parou por um instante, a lâmina de vento repousando ao seu lado, e um sorriso mais sério apareceu em seu rosto.
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— Já está na hora de tirar essa confiança sua. — Liam afirmou, seus olhos agora fixos em Hikaru com uma intensidade renovada. Ele sentia o poder crescente dentro de si, um vento turbulento pronto para ser liberado. — Eu vou acabar com isso de uma vez.
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Ele levantou a espada com força, concentrando sua energia. O ar ao seu redor começou a agitar, e a neve flutuava de maneira desconcertante, como se estivesse sendo puxada por uma força invisível. Com um grito de determinação, Liam brandiu sua lâmina, e uma rajada de vento poderosa foi lançada em direção a Hikaru. A força da corrente de ar parecia quebrar o próprio silêncio da montanha, um rugido feroz que cortava o ambiente.
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Hikaru, com um sorriso descontraído, ergueu sua espada de vento com calma, como se fosse apenas uma extensão de seu corpo. Quando a rajada de Liam se aproximou, ele a desviou facilmente para sua lateral esquerda, fazendo o ataque passar por ele sem sequer tocá-lo. O vento cortava o ar ao redor de sua lâmina, mas ele se manteve imune, como se fosse uma brisa suave.
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"O-o que?! Ele desviou meu ataque? Então ele também tem controle sobre o vento?!" Liam pensou, os olhos arregalados de surpresa. Ele observava atentamente, tentando entender o que acabara de acontecer. O que parecia impossível, agora era uma realidade: Hikaru parecia ter habilidades semelhantes às suas.
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— É tão fraco, não tem fundamentos, não tem sentido. — Hikaru murmurou com desprezo, olhando para a rajada que passara ao seu lado. Ele deu um passo à frente, mais seguro agora, como se estivesse completamente à vontade. — Vocês acham que isso é o suficiente?
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Liam, surpreso, franziu a testa. Nunca imaginou que seu próprio poder seria facilmente desviado assim. Ele sabia que Hikaru não era um inimigo comum, mas a facilidade com que ele controlava o vento deixou Liam desconcertado. A tensão entre eles aumentava, e a batalha acabara de se tornar ainda mais imprevisível.
​
Liam não deu chance para mais palavras. Com um movimento rápido, ele avançou, sua espada cortando o ar com precisão. O som da lâmina sibilando no ar foi o único aviso antes do impacto, cortando a linha entre diálogo e ação.
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Nyra, com uma leveza inesperada, se posicionou ao lado de Liam, seus olhos estreitados, prontos para qualquer movimento do adversário. Ela não estava disposta a esperar para ver se ele era mesmo inofensivo.
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— Cala a boca! Chega de pegar leve, Nyra, vamos com tudo! — Liam gritou, sua voz carregada de determinação. O vento ao seu redor se intensificou, como se respondesse à sua raiva. Ele sabia que era hora de usar toda a sua força. Nyra, ao seu lado, compreendeu imediatamente o sinal. Seus olhos brilharam com foco. O tempo parecia desacelerar por um instante, enquanto ambos se preparavam para atacar com tudo o que tinham.
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Liam ergueu sua espada e, em um movimento rápido, canalizou toda a energia do vento ao seu redor, criando uma rajada feroz, um turbilhão de ar que parecia capaz de rasgar a própria terra. Nyra, com um movimento fluido, avançou com sua lâmina em punho, acompanhando o ataque de Liam em um perfeito sincronismo. O ar se tornou denso com a pressão de seus golpes. Cada movimento era calculado, letal, como se os dois estivessem conectados por uma força invisível.
​
O ataque conjunto foi como um furacão em direção a Hikaru, uma investida que poderia facilmente acabar com qualquer um. O solo tremia, a neve ao redor foi levantada pelo vento que eles haviam convocado, e o cenário se encheu com o som ensurdecedor do impacto iminente.
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— Ahf, vocês não me deixam outra escolha… Terceira forma adaptada; Ventania… — Hikaru suspirou, seu tom descontraído contrastando com a tensão crescente ao redor. Com um movimento fluido, ele levou sua espada para trás, como se estivesse preparando algo grandioso. Seus olhos, antes cheios de zombaria, agora estavam imersos em concentração, observando o avanço de Liam e Nyra com precisão.
​
A lâmina de sua espada começou a brilhar junto com seus olhos, com uma energia peculiar, um brilho verde claro intenso, enquanto o vento ao redor se intensificava, criando uma sensação de peso no ar. Ele não precisava atacar diretamente; sua técnica era outra. Num movimento rápido e preciso, Hikaru cortou o ar com a espada, sem que ela sequer tocasse seus oponentes.
​
O efeito foi imediato.
​
Uma rajada imensa de vento se formou à frente de sua lâmina, como uma onda destruidora. O ar se agitou com violência, empurrando tudo à sua volta. O impacto da rajada foi tão forte que fez Liam e Nyra serem arremessados para trás, seus pés escorregando na neve, perdendo o equilíbrio diante da força brutal do vento. A neve ao redor foi arrancada do chão, levada pelo furioso redemoinho criado pela espada de Hikaru. As árvores próximas se curvaram sob o poder do ataque, suas folhas e galhos sendo varridos para longe, criando uma cena caótica de destruição e turbulência.
​
Liam foi o primeiro a se recuperar, mas não sem esforço. Ele lutou contra o vento que o empurrava para trás, mas o impacto ainda o havia jogado alguns metros. Nyra, igualmente afetada, teve dificuldade em manter-se de pé. A força da rajada foi tanta que ela mal conseguiu evitar ser lançada para o lado, enquanto a visão à sua frente se distorcia com a intensidade do vento.
​
Hikaru, por sua vez, permaneceu parado no mesmo lugar, como se o ataque não tivesse sido mais do que uma simples exibição de poder. Sua expressão estava calma, quase entediada, como se tivesse esperado algo mais interessante. Ele observava os dois capitães, agora em desvantagem, com um sorriso irônico.
​
Liam mal conseguia processar o que acabara de acontecer. Seu corpo ainda tremia com a força do impacto. Ele olhou para o campo de batalha devastado ao seu redor, sentindo o peso do vento em sua pele, as árvores caídas e a neve espalhada como se o mundo tivesse virado de cabeça para baixo. O que... o que ele acabara de ver? Aquele movimento, aquela rajada de vento, algo tão poderoso, tão imenso, que parecia ter sido impossível de controlar.
​
"Isso não é possível..."
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Liam não podia acreditar. Ele também controlava o vento, mas aquilo que Hikaru havia feito estava em outro nível. Liam, um capitão com anos de experiência e domínio sobre suas habilidades, sabia que até ele mesmo jamais seria capaz de gerar algo tão forte e tão devastador. Ele tinha o poder de criar rajadas, mas aquilo... aquilo não era uma rajada. Era uma força da natureza.
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"Como... Como ele conseguiu fazer isso?!" O pensamento de Liam ecoou em sua mente, uma onda de frustração o invadindo. Ele tentou manter a calma, tentar entender, mas a frustração era palpável. Ele já tinha lidado com inimigos poderosos antes, mas nada como isso. Ele sentia que, por mais que treinasse, por mais que se esforçasse, jamais chegaria a esse nível. Era como se ele estivesse diante de uma força inatingível.
​
Nyra, ao seu lado, parecia tão atordoada quanto ele, mas a expressão dela estava mais focada, mais calculista. Ela sabia que precisava reagir, que não podiam simplesmente se entregar ao desespero. Ela olhou para Liam, que agora estava pálido e trêmulo, ainda se recompondo do ataque. Mas os olhos de Liam estavam fixos em Hikaru, uma mistura de raiva e incredulidade, um conflito interno evidente.
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"Ele é só um ladrão... Como isso é possível?"
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A dúvida assolava a mente de Liam, enquanto a cena à sua frente se reconfigurava em uma luta que ele sabia que ainda não compreendia completamente. Eles haviam subestimado aquele inimigo. E agora, a verdadeira batalha… começava?
Liam, ainda recuperando-se do impacto da rajada, olhou para Hikaru com uma expressão cheia de questionamentos. Seus olhos fixos no inimigo, ele não conseguia mais esconder a dúvida crescente.
​
— Afinal... Quem é você? — Liam perguntou, a frustração em sua voz misturada com uma curiosidade que ele não podia mais reprimir.
​
Hikaru, por sua vez, deu um grande sorriso, aquele sorriso que parecia tão natural para ele, como se estivesse completamente à vontade na situação. Ele não estava apenas enfrentando dois capitães poderosos, estava se divertindo com tudo aquilo.
​
— Eu sou Hikaru Kaze, mas eles me chamam de ‘Andarilho do Vento’ — ele respondeu, com um tom divertido. O sorriso em seu rosto se ampliou. — E meu trabalho, bem... digamos que eu precise estar em todo lugar.
​
A resposta de Hikaru pairou no ar por um momento, mais como uma provocação do que uma explicação real. Ele parecia não ter pressa, como se o mundo ao seu redor fosse uma tela em branco, e ele estivesse apenas brincando com as peças de um jogo de xadrez.
​
Liam estreitou os olhos, ainda sem entender como aquele homem diante dele — alguém que parecia ser apenas mais um criminoso, talvez um ladrão — podia possuir tamanha habilidade e poder. Como um "andarilho do vento", ele agora percebia, não era só uma figura mística ou um apelido qualquer. Era a essência de sua força.E isso, para Liam, era uma grande ameaça.
​
Hikaru o encarou, como se soubesse exatamente o que estava se passando na mente do capitão. Seu sorriso irônico se alargou, como se estivesse se divertindo com o desconcerto de ambos.
​
— Agora eu vou dar um aviso para vocês — Hikaru disse, com a voz calma e desinteressada. — Parem de mexer com o desconhecido, não sabem com o que estão lidando. Vocês são apenas peões em um jogo muito maior. Vocês têm sorte que eu não quero machucá-los, senão teria usado a sexta forma.
​
Aquelas palavras cortaram o ar como um aço afiado. Liam sentiu um calafrio percorrer sua espinha. A sexta forma... Algo que ele não compreendia ao que se referia. E o pior, ele não sabia se queria descobrir o que ela realmente significava.
​
Hikaru, com um suspiro profundo, olhou para o horizonte, como se apreciando algo invisível para os outros. O sol já estava bem acima, tingindo o céu de um laranja suave. O silêncio que se seguiu era quase opressor.
​
— Vejam, como é lindo. Este vasto horizonte. Não há sensação melhor do que ser livre, e poder ir para onde quiser… — Ele fez uma pausa, os olhos brilhando com algo profundo.
​
E então, voltou-se para eles, os olhos fixos em Liam com um brilho que parecia ler a sua alma.
​
— Liam, você tem talento, mas ainda é muito fraco para um capitão. Seus ataques não têm fundamentos, sua ventania não tem sentido, e seu espírito não é livre. Se continuar assim, nunca vai conseguir ascender o seu poder.
​
Liam o encarou, tentando absorver aquelas palavras. Aquelas palavras que soavam mais como um julgamento. Ele queria retorquir, queria contestar, mas algo dentro de si sabia que não teria respostas suficientes. O que Hikaru disse... aquilo ressoava.
​
Hikaru olhou para Nyra e Liam uma última vez, como se estivesse se despedindo de uma peça sem importância no seu próprio jogo. A expressão dele ficou mais calma, mais distante.
​
— Agora, se me dão licença, eu preciso ir. Eu poderia ficar aqui mais um tempo, mas não tenho mais o que perder…
​
Ele deu alguns passos até a borda do penhasco, os pés levemente se desestabilizando na neve. Liam e Nyra observaram, sem conseguir fazer nada além de ver aquele homem se afastar como uma sombra, como uma visão distante, impossível de alcançar.
​
— Bom, sabe por que eles me chamam de Andarilho do Vento? — Hikaru continuou, a voz agora mais baixa, mas carregada de uma confiança inabalável. — Bom, é porque eu o domino completamente…
​
Num movimento suave, ele ergueu os braços, como se abraçasse o próprio vento, e algo extraordinário aconteceu. Um par de asas verdes de Soulmana cresceu nas suas costas. As penas cintilaram sob o sol nascente, refletindo um brilho etéreo, enquanto ele se preparava para o salto.
​
Com um movimento final, Hikaru olhou uma última vez para Liam e Nyra.
​

— Nos encontraremos novamente, capitães — E com um salto gracioso, ele mergulhou para a frente, as asas batendo no ar e o levando para longe, como um pássaro indo embora da tempestade.
​
A visão de Hikaru voando para além do penhasco foi a última coisa que os dois capitães viram antes que o vento e a neve tomassem de volta o silêncio da montanha.
​
E o silêncio voltou a tomar conta do ambiente, agora pesado com a sensação de um mistério ainda por desvendar.
Capítulo 3 - Falha na Missão
Liam e Nyra permaneceram parados, incapazes de desviar os olhos do horizonte onde Hikaru desaparecera. O silêncio parecia se estender para sempre, quebrado apenas pelo som distante do vento e da neve caindo suavemente ao redor. Ambos respiravam com dificuldade, não só pelo frio, mas pela intensidade do momento.
​
Nyra finalmente se moveu, ainda em estado de choque, e deu alguns passos hesitantes até a borda do penhasco. O vento frio chicoteava seu rosto, mas ela ignorava a sensação. Seus olhos vasculhavam a imensidão branca abaixo, procurando qualquer sinal de Hikaru. Não podia acreditar que ele realmente havia desaparecido assim, voando como um pássaro. A descrença pesava em sua mente. Ela apertou os punhos, sentindo a frustração crescer dentro de si.
​
"Se eu tivesse minhas asas..." o pensamento a atingiu como uma flecha. "Eu teria ido atrás dele. Eu teria pego ele." Por um breve momento, ela quase podia sentir a lembrança da força de suas asas vampíricas, o poder que antes fazia parte de quem ela era. Agora, restava apenas um vazio, uma sombra de algo perdido.
​
— Ele realmente foi embora... — murmurou, a voz baixa, quase sufocada pelo som do vento.
​
Foi nesse momento que Liam se aproximou, parando ao seu lado. Ele olhou para baixo também, mas depois desviou o olhar para Nyra. Havia uma mistura de preocupação e ceticismo em seus olhos.
​
— É, ele realmente se foi... — respondeu Liam, com um tom que beirava o incrédulo.
​
O som de passos rápidos na neve se aproximou, interrompendo o momento de silêncio tenso entre Nyra e Liam. Ambos se viraram para encarar Kazuki, que surgiu com sua postura rígida, seguido de perto por Ayumi e Rya. Os três estavam ofegantes, claramente exaustos da perseguição, com os mantos cobertos de neve e seus olhos carregados de urgência.
​
— Onde ele está? — perguntou Kazuki sem rodeios, os olhos escaneando o local como se esperasse que Hikaru ainda estivesse por ali. — Vocês o capturaram?
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Nyra respirou fundo, cruzando os braços enquanto dava um breve olhar para Liam antes de responder.
​
— Ele se foi — respondeu, sua voz carregada de uma frustração que ela não conseguiu esconder. — E sim, literalmente foi embora, voando.
​
Ayumi franziu a testa, trocando um olhar confuso com Rya, enquanto Kazuki estreitou os olhos.
​
— Voando? — ele repetiu, o tom incrédulo. — O que você quer dizer com isso? Ele tem algum tipo de artefato ou...?
Liam balançou a cabeça, o peso do momento ainda evidente em seu semblante.
​
— Não foi um artefato. Ele usou Soulmana. Um par de asas verdes cresceu nas costas dele, como se o vento o tivesse carregado. Foi... surreal. Nunca vi algo assim.
​
Rya, que havia se mantido em silêncio até então, deu um passo à frente, o rosto sério.
​
— Você está dizendo que ele manifestou asas com Soulmana? — Havia um tom de espanto na voz dela, como se estivesse tentando entender a magnitude do que fora descrito. — Isso não é algo que qualquer usuário comum consegue fazer.
​
— Ele definitivamente não é comum — murmurou Nyra, virando-se para encarar novamente o penhasco. — Não importa o que sabemos sobre Hikaru, está claro que ainda há muito mais sobre ele que não entendemos.
​
— Eu pensei que estivéssemos perseguindo apenas mais um ladrão de joias qualquer... — disse Kazuki, estreitando os olhos enquanto cruzava os braços. Sua voz estava carregada de irritação, mas também de algo mais profundo: um desconforto diante do que não podia compreender. — Mas isso... isso é muito maior do que parece. Quem é esse homem, afinal?
Nyra soltou um suspiro pesado, balançando a cabeça.
​
— Essa é a pergunta que todos nós queremos responder. Ele age como se fosse apenas um ladrão exibicionista, mas sempre tem algo por trás. Sempre um motivo oculto. — Ela desviou o olhar para Liam. — E agora ele consegue voar. O que mais está escondendo?
​
Ayumi, ainda ao lado de Rya, ergueu a voz, hesitante, mas tentando colaborar.
​
— Talvez ele seja mais do que só um ladrão. Talvez o roubo das joias seja apenas... uma distração? — Ela olhou para os outros, buscando confirmação. — Não faz sentido alguém com aquele nível de habilidade estar agindo apenas por ganância.
Rya assentiu lentamente, os olhos estreitos enquanto processava a ideia.
​
— Ele não age como alguém movido por dinheiro. Pensem bem: ele teve várias oportunidades para desaparecer de vez, mas faz questão de ser visto. Ele quer ser seguido, ou... quer nos mandar uma mensagem.
​
Kazuki respirou fundo, a mandíbula tensa. Ele odiava admitir que talvez Ayumi e Rya estivessem certas, mas as peças começavam a se encaixar de forma desconfortável. Ele virou-se para Nyra e Liam.
​
— Seja o que for, não podemos tratá-lo como só mais um alvo. Precisamos retornar à capital e reportar tudo o que houve.
Precisamos retornar à capital e reportar tudo o que houve. — Sua voz era firme, carregada de um senso de urgência que poucos ousariam questionar.
​
Nyra estreitou os olhos, visivelmente contrariada.
​
— Tem razão, Kazuki — Ela deu um passo à frente, a frustração evidente em seu tom. — Vamos logo, não podemos perder tempo.
​
O grupo começou a se mover, mas antes que pudessem avançar mais, Liam olhou ao redor, seu olhar percorrendo rapidamente o grupo. Com um fôlego pesado, ele finalmente levantou a voz, quebrando o momento de tensão.
​
— Espera, onde está a Elena?
​
O grupo parou por um instante. Kazuki franziu a testa e olhou para Ayumi e Rya, como se esperasse que alguém tivesse visto a jovem.
​
— Eu mandei ela se encontrar com vocês— continuou Liam, impaciente. — Ela deveria estar aqui já.
​
Ayumi e Rya trocaram olhares confusos, como se tentassem lembrar da última vez que viram Elena.
​
— Não a vimos desde que estávamos perseguindo Hikaru — disse Kazuki, com uma expressão de desconcerto.
Nyra revirou os olhos, cruzando os braços.
​
— Ela se perdeu de novo…
​
Liam, que estava a poucos passos atrás, parou e, com um suspiro exasperado, passou a mão no rosto em um gesto clássico de desaprovação. O som da neve sendo pisada sob seus pés parecia intensificar o peso do momento.
​
— Ai, Elena... — murmurou, balançando a cabeça. — Vamos procurá-la logo antes que ela se perca mais na floresta.
​
O grupo se moveu rapidamente em direção à floresta, com o vento frio cortando o ar enquanto seus passos deixavam marcas na neve fofa. A cada árvore que passavam, o silêncio da paisagem gélida parecia engolir qualquer som além de seus próprios passos.
​
Depois de um bom tempo procurando e enfrentando a imensidão branca da floresta, o grupo finalmente encontrou Elena, encolhida atrás de uma árvore e, como de costume, com um sorriso desajeitado no rosto.
​
A tarde começava a cair enquanto o grupo montava seus cavalos, já a caminho da capital. A longa busca na floresta havia finalmente chegado ao fim, e agora, com Elena reintegrada ao grupo, o clima estava mais pesado por causa do tempo perdido.
​
— Eu juro que estava procurando vocês! Mas as árvores são todas iguais, não dá para saber onde ir... — ela tentava justificar, mas sabia que não havia desculpas.
​
— Não é possível, Elena. Era só seguir a trilha de neve! Não tem como se perder! — Liam respondeu com a voz firme, sua paciência já no limite.
​
Elena deu uma risada nervosa, tentando aliviar a tensão.
​
— Eu estava distraída, não vi onde coloquei os pés...
​
— Você sempre está distraída! — Liam não teve paciência para brincadeiras. — Está sempre dando desculpa, mas a verdade é que você se perde por... por pura falta de atenção!
​
Ela mordeu o lábio, sabendo que não podia argumentar mais. A preocupação dele era legítima, e ela odiava quando isso a deixava em situações complicadas.
​
Kazuki, que seguia logo atrás, deu uma olhada para os dois, mas permaneceu em silêncio. Nyra, por sua vez, parecia um pouco mais aliviada, embora tentasse segurar a risada.
​
— Liam, acho que a gente já entendeu o recado — disse Ayumi, tentando desarmar a situação. — Vamos só voltar para a capital e parar de discutir.
​
Ayumi, que estava quieta até aquele momento, deu um pequeno sorriso disfarçado. Ela sabia que, por mais que Liam fosse duro, ele se importava com todos, mesmo que não fosse fácil demonstrar isso.
Liam suspirou fundo, os ombros tensos.
​
— Não é só isso. Precisamos estar focados. Isso não é um passeio.
​
Elena assentiu rapidamente, olhando para o chão.
​
— Eu sei. Vou prestar mais atenção.
​
A conversa seguiu em silêncio por um tempo, com cada um focado em sua própria montaria. O vento gélido cortava a paisagem enquanto o grupo cavalgava em direção à capital, onde novos desafios certamente os aguardavam.
​
— Ele escapou... — Liam finalmente disse, sua voz carregada de uma frustração que ele não conseguia esconder. — Nós falhamos.
​
Elena olhou para ele, surpresa com a falta de detalhes.
​
— O que você quer dizer com 'ele escapou'? — ela insistiu, tentando entender a gravidade da situação. — Como assim?
Liam olhou para ela, os olhos estreitos, uma mistura de cansaço e preocupação visível.
​
— Ele não é apenas um ladrão qualquer, Elena. — Ele falou mais baixo, mas ainda assim, com firmeza. — Esse cara... ele não está agindo só por joias. Ele tem uma missão. E o mais perigoso é que ele sabe mais do que estamos preparados para entender.
​
Aquelas palavras pairaram no ar por um momento, enquanto todos no grupo tomavam consciência de que a missão tinha se transformado em algo muito mais complexo do que inicialmente imaginado.
​
— Mas… O que mais me intriga era o sobrenome dele, Kaze… — Liam…
​
— O que tem o nome? — Kazuki…
​
— Significa vento, qual o sentido de alguém ter o sobrenome que faz jus aos seus poderes? É como se ele estivesse conectado ao vento desde seu nascimento para receber um nome assim…
​
— Mas… o que mais me intriga é o sobrenome dele, Kaze... — Liam murmurou, seus olhos fixos à frente enquanto refletia.
Kazuki, que estava montando ao lado, franziu a testa, desconcertado pela profundidade da observação de Liam.
​
— O que tem o nome? — Kazuki perguntou, inclinando-se levemente para ouvir melhor.
​
Liam manteve a expressão grave, mas seu olhar se endureceu com uma nova camada de incerteza.
​
— Kaze... — ele repetiu, como se a palavra tivesse um peso diferente. — Significa vento. Qual o sentido de alguém ter o sobrenome que faz jus aos seus poderes? — ele virou o rosto ligeiramente para Kazuki. — É como se ele estivesse conectado ao vento desde seu nascimento para receber um nome assim.
​
Elena, que ainda estava tentando processar as informações que haviam sido reveladas, olhou para Liam com um semblante confuso.
​
— Você está dizendo que ele... foi escolhido?
​
Liam não respondeu de imediato. Em vez disso, ele olhou para o horizonte, como se as respostas pudessem surgir do nada.
​
— Não sei. — Ele admitiu finalmente, a voz carregada de uma sensação de frustração. — Mas há algo muito estranho nisso. Pessoas não escolhem nomes como esse sem motivo. E aquela sua personalidade, era tão livre…
​
Liam balançou a cabeça, seus olhos brilhando com uma mistura de curiosidade e desconfiança.
​
— É como se ele realmente tivesse uma profunda conexão com o vento, muito mais do que eu mesmo…
​
— Isso me faz lembrar do meu nome... — Nyra falou, sua voz baixa, quase como se ela estivesse se permitindo um momento de vulnerabilidade. — Minha mãe disse que significava neve, por causa dos meus cabelos brancos...
​
O grupo se silenciu por um instante, como se todos estivessem processando as palavras de Nyra. Kazuki foi o primeiro a reagir.
​
— Neve? Mas é yuki que significa neve... E agora que eu penso nisso, eu nunca conheci ninguém com um nome parecido com o seu, Nyra...
​
Nyra deu um sorriso triste, balançando a cabeça lentamente.
​
— Não, não é no idioma que nós falamos... — Ela fez uma pausa, o tom de sua voz se suavizando. — Minha mãe disse que veio de um idioma antigo, muito antigo...
​
Rya, com seu olhar atento e curioso, franziu as sobrancelhas.
​
— Antigo? Quer dizer... Na primeira guerra?
​
Nyra negou rapidamente, olhando para o horizonte com uma expressão distante.
​
— Não, Rya, muito mais antigo. Muito antes de qualquer guerra. O idioma falado pelas primeiras civilizações, antes mesmo do mundo ser chamado de Eldorium...
​
Ayumi, visivelmente surpresa, não pôde evitar expressar sua incredulidade.
​
— Uou, isso é muito antigo mesmo, mas... como a sua mãe sabe que nyra significava neve nesse idioma tão antigo? Pois... já fazem mais de 1500 anos desde que ocorreu a união das antigas civilizações, e o mundo se tornou o que é hoje...
Nyra ficou em silêncio por um momento, seus olhos se tornando um pouco mais sombrios, como se as lembranças de sua mãe ainda a tocassem profundamente.
​
— Eu... Não sei como ela sabia disso. Minha mãe era uma estudiosa, era uma mulher incrível que sabia muitas coisas... — A voz de Nyra vacilou, e ela precisou parar por um instante. — Eu sinto tanta falta dela...
​
O silêncio se instalou novamente entre o grupo, cada um absorvendo a emoção nas palavras de Nyra. Eles estavam todos ali, conectados de alguma forma, e as memórias de Nyra serviram para aprofundar mais a conexão entre eles.
​
— Eu entendo como é essa sensação, Nyra. Eu também sinto muita falta da minha mãe, mas… não estamos mais sozinhos agora, você tem a nós, e nós temos um ao outro. — Kazuki falou com suavidade, sua voz grave carregando uma compreensão silenciosa, algo que só poderia vir de quem já havia enfrentado perdas.
​
Nyra olhou para ele, um pouco surpresa com a sinceridade nas palavras dele. Ela passou os dedos pelos fios de cabelo branco, uma leve brisa soprando ao seu redor enquanto ela assimilava o que ele dissera.
​
— Obrigado, Kazuki... — Ela respondeu, sua voz mais tranquila agora. — Às vezes, eu esqueço o quanto é bom ter alguém ao nosso lado.
​
Rya, sempre pragmática, também se aproximou, olhando Nyra com um sorriso encorajador.
​
— É verdade. Todos nós temos nossas histórias, mas o que importa agora é que estamos juntos e podemos ajudar uns aos outros. Não importa o que o futuro nos reserve, nós enfrentaremos isso como um time.
Ayumi, com seu olhar gentil, complementou:
​
— E lembre-se, você não precisa carregar o peso sozinha. Estamos aqui para isso, para dividir os fardos e celebrar as vitórias.
​
Nyra respirou fundo, uma sensação de conforto começando a substituir a melancolia que tomava conta dela. Ela olhou para os outros, sentindo-se grata pela confiança que estavam demonstrando.
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— Eu sei... E sou grata por isso. — Ela sorriu, mais uma vez, agora genuína. — Não sei o que faria sem vocês.
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O grupo seguiu em frente, seus cavalos avançando lentamente pela neve, mas agora com um peso a menos no coração de Nyra. Embora a jornada estivesse longe de terminar, eles sabiam que, enquanto estivessem juntos, poderiam enfrentar qualquer adversidade.
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Kazuki olhou para o horizonte enquanto cavalgava, a paisagem silenciosa refletindo seus pensamentos. Os ventos cortantes de Frostgard pareciam não conseguir afastar as lembranças dos últimos dois meses.
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“Já se passaram dois meses desde aquela grande batalha contra Phyritos. O tempo passou rápido demais, e quando olho para trás, fico pensando... quanto tudo mudou.”
​
“Logo após a batalha, fui enviado para a divisão de Nyra. Não posso dizer que estava pronto para isso, afinal, estava acostumado com a 13ª divisão de recrutas, onde tudo era mais tranquilo. Mas a reorganização da nação mudou tudo. A 8ª divisão se tornou a 7ª, e agora nossa responsabilidade é outra: a defesa interna, manter a paz dentro da própria nação. Nada de missões diretas na guerra, nada de atuar nas linhas de frente. Apenas resolver assuntos internos, proteger nosso próprio território.”
​
"Nos primeiros dias, eu me senti como um peixe fora d'água. Mas logo, os outros membros começaram a se juntar a nós, e foi aí que as coisas começaram a ficar... interessantes."
​
"Nyra... No começo, eu pensava que ela fosse apenas mais uma daquelas pessoas sérias demais. Tinha esse ar rígido, imbatível, que não dava espaço para mais nada. Mas depois, à medida que fomos nos conhecendo, percebi o quanto ela é... diferente. Ela tem uma bondade escondida atrás daquela fachada de gelo. Às vezes, sinto que ela carrega uma carga muito pesada, como se estivesse tentando esconder algo, mas sempre que o grupo precisa dela, ela está lá, sem hesitar. Ela faz com que todos se sintam cuidados, sem nem perceber. De qualquer forma, ela não hesita em lutar por seus companheiros, e é difícil não admirar isso."
​
"Liam, por outro lado... Ah, esse cara é um mistério. Ele tem aquela fachada durona, como se fosse sempre o líder que não se abala. Mas, mesmo assim, percebo o quanto ele se importa com cada um de nós. Não sou bobo. Ele pode tentar esconder isso, mas... a maneira como cuida da Elena... Isso é algo que não engana, e acho que tem algo a mais nisso. Ele tem um coração maior do que mostra. No fundo, acho que ele se sente responsável por todos nós, mesmo que não consiga admitir."
​
"E Ayumi... quem mais poderia ser como ela? Sempre com sono, sempre com preguiça, mas quando a missão começa, ela é a primeira a estar lá, sempre pronta para ajudar. Ela é uma dessas pessoas que, sem fazer muito barulho, faz toda a diferença. Eu acho que se não fosse por ela, o grupo não teria o mesmo equilíbrio. Ela tem uma maneira tranquila de nos manter todos juntos, mesmo que sua principal ocupação pareça ser dormir."
​
"Rya... Ah, Rya, a mascote do grupo. Sempre alegre, sempre positiva, sempre com um sorriso no rosto. Às vezes, sinto que a energia dela é o que mantém todos nós unidos. Ela tem essa aura infantil e elétrica que nos faz esquecer das dificuldades, como se ela fosse capaz de afastar a escuridão com seu otimismo contagiante. Nunca vi alguém com tanto ânimo."
​
"E então, tem a Elena. A mais engraçada de todos nós. Sempre desajeitada, sempre caindo de um lado para o outro. Parece que ela vive em um mundo próprio, onde nada dá certo, mas... de alguma forma, ela sempre está lá para cuidar de todos nós. Eu não sei como ela faz isso, sendo tão dependente da ajuda dos outros, mas ela sempre tenta nos proteger. Como uma mãe que cuida dos filhos, mesmo que ela seja a primeira a ser cuidada. Acho que, no fundo, todos nós, mesmo com nossas diferenças, nos protegemos uns aos outros."
​
"A cada dia que passa, eu fico mais convencido de que a verdadeira força de uma divisão não está na espada ou nas habilidades de combate. Está na união, na forma como cada um de nós se apoia. E, por mais que nossas missões possam ser difíceis, eu sei que, enquanto estivermos juntos, nada será impossível. Esses dois meses foram só o começo. Eu sei que o futuro nos reserva desafios ainda maiores, mas... com esses companheiros ao meu lado, talvez eu até comece a acreditar que, talvez, só talvez, a gente consiga vencer tudo."
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Kazuki balançou a cabeça, afastando as memórias e trazendo sua atenção de volta ao presente. O som dos cascos dos cavalos quebrava o silêncio da trilha, enquanto o frio persistente de Frostgard os acompanhava como um companheiro indesejado. Ele olhou para o horizonte novamente, observando o sol começando a desaparecer, tingindo o céu de tons alaranjados e rosados.
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"Cinco dias... Mais cinco dias nessa estrada gelada até chegarmos na capital." Ele suspirou, quase podendo sentir o peso extra dessa espera. "Será que não dava pra ter um atalho ou, sei lá, uma passagem mágica que nos levasse direto pra lá? Já estou cansado só de pensar em mais noites no meio do nada, congelando."
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Ele olhou para os outros, que pareciam perdidos em seus próprios pensamentos ou distraídos pela viagem. "E, claro, com a sorte que a gente tem, aposto que alguma coisa vai dar errado no caminho.”
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Apesar do tom reclamão, ele sorriu de canto, um sorriso quase imperceptível. Porque, no fundo, por mais que resmungasse sobre o tempo na estrada, o frio e as noites difíceis, ele sabia que estar com aqueles companheiros tornava tudo suportável. E, de alguma forma, até mesmo a longa viagem parecia valer a pena.
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E assim, o grupo seguia sua jornada, avançando pela trilha coberta de neve rumo à capital. A cada passo dos cavalos, o som ritmado dos cascos preenchia o silêncio das vastas planícies de Frostgard. A paisagem, apesar de bela em sua imensidão gélida, era monótona e implacável, mas, juntos, eles enfrentavam o frio e a distância.
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